21/03/2009

LIMPEZA E DESTRUIÇÃO DE PROCISSIONÁRIAS

Hoje, a tarde tinha ficado programada para a limpeza e destruição de procissionárias nas imediações da Clínica BandarraVet.

Tivemos a ajuda da minha amiga Bruna, que desconhecia a procissionária, e como comentado no post anterior, dos seus efeitos. Para quem tem animais de estimação nunca é demais prevenir-se nesta época onde a procissionária está preste, se não já em alguns locais, a sair do seu casulo em direcção à terra.

Por isso, anualmente procedemos à limpeza e destruição, em prole dos animais que por aqui se encontrem, dos que possam vir à clínica e do Batanete que tem o seu próprio parque.

Retirar os casulos, cortando-os

Transportando-os, para a fogueira


Casulo: não se vê nada, pois não? Mas era pesado!

Aqui estão elas, às dezenas e rechonchudas!




A Bruna, espantada, e no seu trabalho, cuidadoso, de as destruir, com cuidado, pois o próprio movimento do casulo, liberta toxinas.


Em direcção a mais um casulo...


E este era bem maior, vejam...

O mesmo casulo

Às centenas... e não estou a exagerar!

Não finalizamos tudo, faltou-nos o alpinista Patrick, para chegar ao cume dos pinheiros grandes, e tivemos uma urgência inesperada no início da tarde. Fica novamente agendada uma nova limpeza, no próximo sábado.

Quem quiser, pode comparecer!
Obrigado Bruna!

14/03/2009

ENVENAMENTO POR PROCISSIONÁRIA


O diagnóstico de envenenamento pela procissionária do pinho é baseado no quadro clínico, mas também pelos dados epidemiológicos.

Esta patologia surge principalmente na Primavera, causada por uma efracção cutânea ou mucosa de pêlos urticantes que possuem uma toxina. Estes pêlos estão presentes nas lagartas procissionárias do pinho, nos estados larvares L3, L4 e L5 da Thaumetopoea pityocampa. Estas lagartas são frequentemente encontradas em "fila indiana" e são cobertas de seda ornamental e, sobretudo de pêlos urticantes.

O nome de procissionária advém da Thaumetopoea pityocampa se deslocar em "fila"


EPIDEMIOLOGIA

  • As procissionárias infestam florestas, sobretudo na orla mediterrânica onde encontram as árvores resinosas que as alimentam e um clima favorável ao seu desenvolvimento. Encontra-se na Europa meridional e central mas também no norte de África.
  • O envenenamento ocorre sobretudo no final do inverno e início da primavera (Janeiro a Junho), segundo as condições meteorológicas. Este período corresponde à saída das larvas que saem dos casulos para se alimentar na árvore quando as temperaturas atingem 10ºC, altura que descem para iniciar a muda (ninfa) subterrânea quando a temperatura atinge os 20ºC.
  • A proximidade de árvores resinosas ou passeios em plena floresta são os dados mais recolhidos na anamnese do caso. O cão, a espécie mais atingida (93% em 2002), pode entrar em contacto com os pêlos urticantes transportada pelo vento; com as lagartas, particularmente atractivas quando em fila indiana; com objectos cobertos de pêlos urticantes ou ainda com os casulos caídos no chão.
  • O gato é menos atingido que o cão em virtude do seu comportamento mais cauteloso e da sua exploração bucal menos marcada.
  • O envenenamento também pode afectar os equídeos, ovinos, caprinos e suínos.

SINTOMATOLOGIA

Os sinais clínicos são devidos à toxina libertadora de histamina, a thaumatopoeína, contida no pêlo urticante e libertado aquando a sua ruptura (como uma ampola). O simples contacto não é suficiente para a ruptura; uma efracção cutânea é necessária, facilitada pela forma do pêlo (extremidade proximal lisa e farpas na extremidade oposta como se de um arpão se tratasse). A thaumatopoeína provoca a desgranulação dos mastócitos com a secreção de histamina, mediadora da inflamação.

Os sinais clínicos seguem-se rapidamente: de alguns minutos a poucas horas. Vários sinais são observados mas são sobretudo os sinais locais que alertem os donos.
Alterações bucais e digestivos são os mais marcados e de carácter evolutivo. A língua é o orgão mais afectado. Os outros sinais locais são mais raros nos animais (muito mais frequente no homem).

  1. LESÕES LOCAIS
  • LESÕES BUCAIS E DIGESTIVAS
A inflamação, que se traduz por edema lingual, sub-lingual e/o labial, pode em primeira instância, não ser perceptível para os donos, mesmo se o animal manifesta sinais evidentes de dor aguda, comparada à de uma queimadura. Surgem de seguida, o ptialismo (salivação excessiva) e dificuldades na deglutição, que são os sinais de alarme que motivam a consulta.

A Ara foi atingida quando tinha 10 meses. Ptialismo, edema labial, facial e lingual. Esta foto, pelo carácter urgente que teve o caso, só foi tirada ao 3º dia. Ainda eram visíveis os sinais.

Outro caso clínico: necrose sublingual apical por compressão vascular

Mesmo caso: úlceras profundas no dorso da língua. Foram ainda retiradas pêlos urticantes na língua que se encontravam na mesma.

Edema da glote. Este cão teve queimaduras do esófago.

Necrose da língua
Remoção do tecido necrótico

Uma glossite (inflamação da língua), estomatite (inflamação da gengiva bucal) e uma queilite (inflamação dos lábios) são acompanhadas por úlceras de diversa extensão na língua. Na face dorsal da língua podemos encontrar úlceras profundas quando glossite é pronunciada.
A compressão vascular na base da língua leva a cianose do órgão, em poucas horas.
Se houve ingestão de lagartas, surgem vómitos, ptialismo em virtude da inflamação do esófago e gastrite induzida. Alguns casos de diarreia são descritos.

  • LESÕES OCULARES
As lesões oculares surgem isoladas quando os pêlos urticantes são transportados pelo vento atingem, por contacto, os olhos do animal ou quando a face é violentamente afectada. Observa-se uma conjuntivite (eventualmente associada a uma blefarite) e/ou uma queratite ulcerativa. Se o pêlo atinge perpendicularmente a córnea e penetra em profundidade, desenvolve-se uma queratite nodular que pode levar a cegueira. Um exame minucioso oftalmológico é recomendado.
  • LESÕES CUTÂNEAS
  • As lesões cutâneas de tipo urticário (placas ou lesões lineares) são raras em virtude da própria pelagem do animal. São placas eritematosas nos lábios ou em zonas de pele fina exposta e pododermatites.
  • Estas placas podem aparecer nos donos e médicos veterinários (muito frequente) que manipulam o animal.
É aconselhável o uso de luvas e vestuário de manga comprida na manipulação destes animais.

2. SINTOMAS GERAIS
  • Se os sinais locais poem ser moderados e de bom prognóstico, as alterações gerais, mais raras, podem pôr em risco a própria vida do animal em poucas horas. Manifesta-se por uma evidente prostração, podendo evoluir ao estado de choque.
  • Os sintomas respiratórios são possíveis (tosse, rinite, dispneia) e causados pelo contacto com a trufa, inalação de pêlo ou pelo aparecimento de edema da laringe, após ingestão da lagarta.
  • A disfagia e dispepsia podem levar à uma hipovolemia marcada insuficiência renal aguda.
  • Uma coagulação intravascular disseminada (CIVD) aguda pode-se desenvolver nas horas ou alguns dias após o acidente.
Outras alterações gerais observadas: hipertermia (até 41ºC); choque anafiláctico com edema facial, coma, tremulações musculares, e por vezes convulsões. O síndrome de resposta inflamatória sistémica (SIRS: systemic inflammatory response syndrome) e o síndrome de falência multi-orgânica (MODS: multiple organ dysfunction syndrome) são complicações graves, que podem levar à morte do animal.

PROGNÓSTICO DO ENVENENAMENTO

A evolução do caso depende da rapidez do tratamento, mas também da intensidade, extensão e da região do contacto com a substância urticante.
  • Diversas evoluções são observadas. O desaparecimento dos sintomas é rápido (algumas horas) para 1/3 dos casos, permanece em menos de três dias para outro terço e as lesões podem persistir para os restantes.
  • O prognóstico a curto prazo depende da severidade das repercussões sistémicas (insuficiência renal aguda, edema da laringe, CIVD, etc).
  • O prognóstico a longo prazo é variável consoante a gravidade das lesões da língua. A parte apical segue a evolução clássica de urticária. A cicatrização e retoma funcional do órgão (diminuição do tamanho e mobilidade) pode durar 10 dias a um mês, mas a necrose deixa com frequência sequelas extensas.
- Queda mais ou menos importante da parte apical da língua, em presença de lesões múltiplas ou difusas;
- Aspecto rugoso dos bordos do órgão na presença de lesões pontuais;
- Cicatrizes estenosantes.

12º dia após o acidente: é visível a extensa zona de necrose (zona branca), tecido irremediavelmente morto. Pode-se, no entanto avistar, a proliferação de um novo tecido, granuloso, nas bordas.


Não só na parte apical da língua mas também na base, esófago e estômago (a Ara ingeriu lagartas)

19º dia, já com deiscência de parte da língua

24º dia: cicatrização



Mesmo que um cão perca cerca de 30 a 50% da língua, a readaptação à alimentação ocorre com alguma brevidade e volta à uma vida normal (a Ara adaptou-se bem mesmo com mais de 1/3 do órgão perdido). Numa primeira fase, deverá ser privilegiada uma alimentação líquida, depois mole. Se a queda da língua é moderada, um ligeiro ganho de substância cicatricial é evidenciado após alguns meses. Em contrapartida, se a necrose for total, a preensão dos alimentos é muito difícil e o prognóstico, muito sombrio, pode conduzir à eutanásia.

PROFILAXIA

A profilaxia dos envenenamentos baseia-se na vigilância de 3 factores:
  1. O médico veterinário deve prevenir os donos do risco de envenenamento.
  2. A comunidade local deve informar os locais de risco.
  3. Os donos avisados têm uma responsabilidade acrescida em evitar o contacto dos seus animais com as procissionárias ou casulos, durante os passeios (sempre a trela).
  • Para além de uma vigilância apertada na zona e durante os períodos de risco, a profilaxia passa pela sua destruição. Esta luta reverte-se de suma importância, não só médica e de saúde pública em virtude do envenenamento humano e animal, mas também pela própria ecologia e consequências económicas: estes insectos destroem as florestas resinosas.
Casulo
Destruição por fogo

Todo o corpo médico veterinário e assistentes devem identificar por telefone os sinais de alerta de envenenamento por procissionária, informar os donos da urgência do caso e dar instruções prévias antes da chegada do animal à clínica.

08/03/2009

PELA SERRA DA ESTRELA

Hoje foi assim, depois das obrigações aos internados da Bandarravet...




03/03/2009

CASOS CLÍNICOS I

Apresento-vos de seguida algumas fotos de casos reais ocorridos na Bandarravet (Clique aqui)
À medida que forem concluídas as edições dos textos, será feita a sua respectiva abordagem e descrição da patologia em causa.

Poderão ficar os mais sensíveis incomodados com algumas fotos, mas quem disse que na clínica veterinária tudo é "cor de rosa"?
Quem disse que para além do caso clínico, não está todo um trabalho de bastidores?
Quem disse que não temos de confrontar os clientes; reconfortá-los; e quiçá, também curá-los?

Toda a envolvente de um caso clínico encontra-se interligada por diversas vertentes: epidemiológica, patológica, económica, social e cultural. Esta última muito intrincada com os valores conscienciosos de cada cliente.

À nós, corpo clínico, compete-nos restabelecer a harmonia no seio familiar onde está inserido o animal, com vista à sua convalescença e protecção da sociedade.
Tentemos, sempre que possível, encontrar a melhor solução com todas as partes inerentes atrás citadas.
Não é fácil. Mas também não é impossível!
Algumas vezes, muito reconfortantes, outras vezes com final inesperado por ambas as partes (clientes e corpo clínico), em busca da saúde pública. Outras, não concluídas por interrupção ou desistência dos donos. Outras com término inevitável, por ter sido um curso irreversível...

A nós interessa-nos, seja ele qual for o caso clínico, que:
  • Tenhamos feito o nosso empenho da melhor forma.
  • Tenha sido informado o cliente da patologia, fisiopatogenia, tratamento e prevenção.
  • Independentemente do estrato sócio-económico dos donos, tenha sido encontrada a melhor solução.
  • Tenha o cliente aprendido a prevenir o seu animal.
  • Tenhamos todos contribuídos para a melhoria da saúde pública.
Porque só encontramos harmonia no nosso lar, quando todos os envolventes estiverem em harmonia. Não tenham medo da doença, tratamento e consequências, pois se não o fizerem, o vosso lar será constantemente fustigado por um desequilíbrio.

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